4.12.2006
Primeira Seção Cível
Mandado de Segurança - N. - Capital.
Relator - Exmo. Sr. Des. Divoncir Schreiner Maran.
Impetrante - Fernanda Felix Carvalho.
Advogado - Laércio Arruda Guilhem.
Impetrado - Secretário de Estado de Gestão Pública de Mato Grosso do Sul e
outros.
Proc. Est. - Rodrigo Silva Lacerda César.
E M E N T A MANDADO DE SEGURANÇA CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DO CARGO DE DELEGADO FASE MERAMENTE ELIMINATÓRIA ASSEGURADA PARTICIPAÇÃO DO CANDIDATO NA FASE SUBSEQÜENTE DO CERTAME PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E RAZOABILIDADE SEGURANÇA CONCEDIDA.
Se o candidato obteve aprovação em fase do certame que possuía caráter meramente eliminatório, e não classificatório, fere os princípios da isonomia e da razoabilidade a cláusula editalícia que limita o número de participantes para a fase subseqüente segundo a ordem de classificação.
Havendo contradição entre os termos do edital, incumbe ao Judiciário emprestar interpretação àquele instrumento que melhor atenda ao interesse público, consistente na seleção dos melhores candidatos.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Primeira Seção Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade e com o parecer, conceder a segurança. Ausente, por férias, o 1º vogal.
Campo Grande, 4 de dezembro de 2006.
Des. Divoncir Schreiner Maran Relator
RELATÓRIO
O Sr. Des. Divoncir Schreiner Maran
Fernanda Felix Carvalho impetra Mandado de Segurança com pedido de liminar contra o Secretário de Gestão Pública de Mato Grosso do Sul, Diretora da Fundação Escola de Governo de Mato Grosso do Sul e Presidente da Comissão Organizadora do IV Concurso Público para Provimento do Cargo Inicial de Delegado de Polícia, objetivando sua continuidade no certame, tendo em vista sua não convocação para a 3ª fase daquele ato, embora aprovada na fase anterior.
Aduz, em apertada síntese, que não poderia ser obstada sua participação na 3ª fase do certame, visto que a fase anterior possuía cunho meramente eliminatório, e não classificatório.
A liminar foi concedida.
A autoridade coatora prestou as informações de estilo e pugnou pela denegação da segurança.
A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer, opinou pela concessão da segurança.
VOTO
O Sr. Des. Divoncir Schreiner Maran (Relator)
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Fernanda Felix Carvalho em virtude de sua não convocação para a realização da 3ª etapa do concurso público para a carreira de Delegado de Polícia Civil do Estado de Mato Grosso do Sul, a despeito de haver sido aprovada na 2ª fase daquele certame.
Conforme se infere do Edital nº 01/2006, o concurso seria realizado em três fases, sendo que a 2ª fase consistia em provas de capacitação física, sindicância da vida pregressa do candidato e investigação social, todos de caráter eliminatório, consoante o disposto no item 6.2 do edital.
A impetrante obteve aprovação em referida fase, porém ocupou o 41º lugar na ordem de classificação geral, o que ensejou sua não convocação para a fase seguinte do concurso.
A Administração fundamenta o ato combatido no item 17 do edital, redigido da seguinte maneira:
17 Da 3ª fase Entrevista Preliminar, Prova Oral e Curso de Formação Profissional.
17.1 Serão convocados para a 3ª fase- Entrevista Preliminar, Prova Oral e Matrícula no Curso de Formação Profissional, os candidatos aprovados na 2ª fase, obedecendo ao número de vagas acrescido de 40%, na ordem de classificação.
17.1.1 Os candidatos não convocados para matrícula na 3ª fase estarão eliminados do concurso.
Eis aí o cerne da divergência. A impetrante não foi convocada para a 3ª fase do certame porque não estaria classificada entre o número candidatos (nº de vagas =15 + 40%) estipulados para participar daquela etapa.
Ocorre que, ao se realizar uma atenta leitura às normas constantes do edital, constata-se que o instrumento convocatório apresenta-se extremamente confuso, causando grande incerteza acerca do critério de avaliação a ser utilizado pela Administração, tanto que inúmeros foram os mandados de segurança distribuídos a esta Corte que atacavam as normas constantes do edital.
Ora, se a segunda fase do concurso possuía caráter meramente eliminatório, e sendo a impetrante aprovada naquela etapa, causa estranheza a limitação do número de concorrentes para a fase seguinte do certame, pois tal restrição viola o princípio da isonomia e da razoabilidade, uma vez que impede um melhor recrutamento de candidatos para o exercício do cargo em disputa, em detrimento do interesse público.
Em um certame objetiva-se a seleção dos candidatos que não só apresentem melhor desempenho nas provas a que são submetidos, como também melhor se enquadrem no perfil técnico e intelectual exigido para a função a ser desenvolvida, a fim de que os cargos públicos possam ser exercidos com excelência, a serviço da coletividade. Essa é a razão para a realização dos concursos públicos.
Nessa esteira, sabe-se que a Administração vincula-se ao edital convocatório, de maneira que não pode alterar discricionariamente as normas do concurso e, tampouco, pode valer-se de critérios, que, de certo modo, frustrem a concorrência e a busca pelos melhores profissionais.
Portanto, não me parece razoável que a Administração em um primeiro momento atribua à 2ª fase do concurso caráter meramente eliminatório e, posteriormente, limite o número de participantes à 3ª etapa do certame, em virtude de classificação obtida na fase anterior.
Isso porque, se a impetrante obteve aprovação na 2ª fase certamente poderia prosseguir na disputa pelas vagas disponíveis, pois poderia obter, como de fato aconteceu, uma melhora em sua classificação final e até mesmo aprovação definitiva no certame.
Frise-se que, se a 2ª fase do certame possuía cunho eliminatório, por disposição expressa no edital, não pode a Administração atribuir-lhe caráter classificatório para proceder a convocação dos candidatos à fase subseqüente, o que vem a demonstrar os termos contraditórios em que o edital foi subscrito, gerando profundas incertezas sob os participantes do concurso.
Ao meu sentir, em prestígio ao princípio da isonomia e da razoabilidade, a melhor interpretação que se extraí do instrumento convocatório é aquela que atribui à 2ª fase do certame o caráter unicamente eliminatório, e assegura aos nela aprovados a participação na fase subseqüente.
Como consectário lógico do quanto esposado, deve ser assegurado à impetrante, como o foi, a participação na 3ª fase do certame, uma vez que, nos termos do item 22.1 do edital, a classificação final do concurso será obtida pela média aritmética das notas de avaliação final da prova escrita discursiva somada à pontuação obtida na prova de título, avaliação final da prova oral e avaliação do curso de formação policial.
Aliás, é importante advertir que no Diário Oficial nº 6783, fora publicado o decreto P nº 2.459/2006, de 04/08/06, em que o Governador do Estado nomeou a impetrante, em caráter efetivo, para exercer o cargo de Delegado de Polícia, cuja classificação geral circunscreveu-se ao 17º lugar, fato que enseja a aplicação da teoria do fato consumado , segundo a qual, pelo decurso do tempo, a situação da impetrante já se consolidou.
Ou seja, a prestação jurisdicional não deve traduzir em um mal maior do aquele que teria sofrido a impetrante se não tivesse sido assegurado o seu possível direito via liminar.
Posto isso, com o parecer, ratifico a liminar e concedo em definitivo a segurança pleiteada, a fim de reconhecer a aprovação do impetrante na 2ª fase e assegurar-lhe a participação na 3ª fase do certame.
DECISÃO
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE E COM O PARECER, CONCEDERAM A SEGURANÇA. AUSENTE, POR FÉRIAS, O 1º VOGAL.
Presidência do Exmo. Sr. Des. Rêmolo Letteriello.
Relator, o Exmo. Sr. Des. Divoncir Schreiner Maran.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Divoncir Schreiner Maran, Paschoal Carmello Leandro, Rêmolo Letteriello e Josué de Oliveira.
Campo Grande, 4 de dezembro de 2006.
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